18 fevereiro 2008

Quebrada – Parte III

Agora acho que está muito evidente. Num tem como esconder uma coisa dessas por tanto tempo; Achei estranho esse sentimento preso assim, sem se manifestar, mas agora com as duas na minha frente, nem tem como. A presença da Jana ta quebrando qualquer tipo de racionalidade, saca? É, pior que acho que quem sacou foi a Nádia. O olhar dela já está fuzilante(é ela ta na razão dela). Caralho, acho que foi o lance do Luna. Talvez o sentimento de desespero, a falta de confiança na vida, que fez com que a gente percebesse que fizemos merda em ter separado nossas vidas. Mas aí, a Nádia num tem culpa de nada. Ela tava na dela, num merecia uma traição assim, não desse jeito, não depois de tudo que a gente passou.
- E aí, vocês vão ficar parados sem fazer porra nenhuma? – a Nádia falou com um certo grau de ironia nos olhos. – Pior que era verdade, Tínhamos que dar um jeito nas coisas.
- Ela ta com a razão. – Jana pegou sua bolsa e saiu em direção a porta. – Eu preciso voltar pra lá. Quanto à você é melhor não aparecer por um tempo, pelo menos enquanto à merda ta quente. – Pior que eu tinha que concordar.
Fiquei pensando no enterro. Deve ser foda ir no enterro de alguém que você sente uma certa admiração. Me lembro do enterro do tio Lauro lá no São Luis. Foi uma parada tensa. A tia Judite bem que tentou segurar a barra, mas aí, quando ela viu a terra batendo no caixote de madeira, a cena foi bem diferente. Quanto mais demonstrava força, ou tentava demonstrar, mais caia em pranto. Chorava copiosamente. Chorava que nem uma condenada, como é mais comum a gente dizer. Mas me diz então: Quem num tá condenado, por aqui?
Quer saber, vou seguir o conselho de todo mundo e vou ficar no sapatinho. Nada de loucura.
Mas num tem como cabular enterro.
Acho que essa seria a coisa mais medíocre que eu poderia fazer. Não sou cabaço assim. E, pior, se eu dou uma dessas, minha imagem iria se queimar pra cacete aqui com todo mundo. Quem tem sangue frio assim, e pensar apenas no seu ego enquanto um truta vai descendo terra abaixo?
Que se foda, essa porra de vida num é aula de matemática. Eu lembro que dava pra ficar de boa no pátio do Magalhães, no Davina também. Colégio do Estado é tudo assim. Os caras fingem que dão infra-estrutura pros professores e pros funcionários, mas no fundo são um bando de idiotas engomados, que pouco se lixam para o que acontece na periferia. Se preocupam apenas se as escolas seguem as recomendações internacionais. Mas pra isso, burlam uma pá de números. Se eles conseguissem transformar aquela escola que eles mostram no horário político, em modelo de escola pública ia ser bom pra caramba. Mas que nada. Os caras são demagogos demais para pensar nisso. São tão ordinários, que só passam por aqui em época de eleição. De dois em dois anos, aparecem uns vermes por aqui na quebrada. Por isso que ta mais do que na hora de começar a dar fim nessas praga. Aí, ta na hora da revolução.
To ligado que deve ter um monte de guerreiro só esperando um vida loka qualquer botar a cara à tapa e levantar uma missão. Acho que essa parada eu consigo, hein? Tem hora que eu quero saber os porquês dessa merda toda. Num é por acaso que estamos aqui do outro lado da vida, às margens do mundo, tipo, marginal mesmo, saca? Acho que ta mais do que na hora de tomar o comando, ou pelo menos dar um susto nesses pipocas pau no cu. Porra, acho que a morte do Luna ta começando a fazer efeitos positivos. Se pá, achei sentido pra minha vida.
Acho que eu só pensava em encher o cu de maconha. Caralho, a vida é bem mais que isso. Se for necessário, sou capaz de deixar minhas duas minas por aqui. Num se deve levar quem a gente mais ama pra uma guerra. E to ligado que essa batalha, vai ser sangue nos olhos. Quem é capaz de enfrentar os filhos da puta que comandam o sistema e sair de boa? Eu num conheço ninguém. Ce ta ligado, enfrentar na bala deve ser foda, num sei nem se dá. Mas tem outros meios. Deve ter! Cara, lembro daquela mão que eu tava no Saldanha tomando uma cerva e de repente começou a colar os caras da 1dasul . Porra, foi foda demais. Tinha uma pá de universitário até. Colou o Ferréz, e teve uma parada lá que ele falou que era um encontro de “literatura marginal”. O Gog, um mano que faz um som firmeza demais mandou bem nos poemas. Aquele Arnaldo Antunes, que cantava naquela banda famosona chegou na maior humildade, falou com todo mundo, representou na poesia e saiu numa boa. Porra, se todo artista fosse assim, acho que o conceito de celebridade ia deixar de existir. O que ia ter de neguinho de revista de fofoca perdendo emprego, ia ser mato.Ah, teve também aquela mina que é vereadora, e que já participou de várias paradas na tv. Acho que ela trabalhava na MTV. Porra, essa mina tava lá de boa falando da merda que é o mundo da política. Ela disse até que devem ser só uns 5% dos caras que foram eleitos,que prestam de verdade. A outra parte, os 95% só estão lá pra foder a gente. Pra mamar na teta mesmo, ta ligado? Eu ouvi a conversa dela com aquele maluquinho que trampa no banco aqui perto de casa, o Tuds. O cara é de boa, mas vacila pra caralho. O mano é formado em uma parada de comunicação, eu acho, um lance de rádio, tv, num lembro direito. Só que vive naquela merda de banco, fazendo o que os caras lá de cima mandam. Mas se liga, ele já me confessou que é louco por essas paradas de mudar o mundo, sabe-se lá como. Aí, eu acho que esse maluco é o cara pra me ajudar nessa parada de revolução, tá ligado?

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