31 março 2008

Se...

O meu futuro será a angústia do presente.
Se o presente é meu, ou seu, desconheço;
O que fazes agora não importa;

Não sabes do amanhã. Se é isso que queres,
Se não se arrependerás, se faz a coisa certa.
Se soubesse o sentido do se, seria mais ser.

Se o se não existisse, o que seria do ser?
O que seria dos seres, se o que é fosse apenas
Um se mal resolvido, ou se não existisse?

Se os sonhos fossem alimentados de suposições?
Se as suposições alimentassem as certezas?
E se fosse possível e previsível ser feliz?

Se eu bem recordo, o amanhã não se sabe.
Não se diz, não se cala. Ele vem. Se vem...
Se eu pensar no se, não serei o amanhã.

E se o amanhã teimar em vir. Que se foda.

Calar-se-á?

Entregou o poema, não o dilema.
Não se entregou, nem fez questão.
Não respondeu. Nem perguntou.
Calado. Lacônico. Angústia resoluta.

Uma pausa para o café. Um lampejo.
Gole negro; Tenta buscar a idéia.
Ela foge, arredia e preventiva.
Não faz parte do dilema. Nunca fez.

Nas revistas não recorta esperança;
Nos jornais, notícias de um velho mundo;
O que há de novo além de solidão?
O que há na solidão que sente de novo?

O menino corre pela rua.
Já é hora de ser atropelado?
Não. Esse é aquele que vai vender chiclete.
Mas é temporário. Logo o crime flertará.

E de quem é a culpa? Do Café?
Do poema? Da prosa? Da Poesia?
Ou das Idéias, que desde que entraram,
Não deixaram a fresta da razão se calar?

Calar-se-á?

28 março 2008

Luvas

Tenso. Mina o visível descalabro.
Arredio, não quer abraçar as ruínas.
Está certo. Muito foi feito até então.
E agora, desistir? Abandonar as obras?

Não tem idéias a suprir. Admite e se cala;
Guarda baixa, olhos cansados, cabelo amassado.
Está nas cordas, está na lona, está no chão.
A contagem é aberta. A derrota é aguardada.

Na platéia, entre uivos e delírios, entende a idolatria.
Não é mais herói – talvez nunca o foi – E isso dói.
Dor seca, lancinante e solidária. Sua derrota,
Não cabe mais em uma garrafa de doze anos.

Suas lamentações, talvez; Todavia, o único gelo que vê
É o que colocam em seu rosto quente. É físico, é latente.
Antes fosse depressão (comprimidos tem controlado);
Antes fosse paixão (coração tolo tem de sobra);

É sangue. Amanhã, quando aparecer na teve, será passado.
O futuro, mais uma vez deixará claro, que não tem presente.
Lembrará dos primeiros treinos e da ânsia de ser um campeão.
Mas no hospital, apenas a mídia sensacionalista dará notícia.

Sem amigos, nem inimigos para sorrir de seus hematomas.
Sem impaciência para sair dos aparelhos e descer para um quarto.
Na UTI, aproveitará a paz e abraçará o ermo de seu existir.
Se tiver sorte, uma enfermeira descuidada desligará os aparelhos.

Quem sabe, volta a ser campeão?
Vencedor de suas inquietudes e dramas.
Merecedor do cinturão mais nobre.
Calmo. Mina a invisível conquista.

Abre o Sorrir

Os olhos curvados ao sorriso;
Olhar ancho, que sorri e conforta.
De soslaio, diz apenas o que basta.
É fartura, para quem tem solidão;

Esplendor, para quem se escurece;
Não atrai os raios que esguelha;
Não conduz a luz que a apaga;
Opaca, conforta-se em palavras turvas.

Escreve e não lê. Desconhece a história.
Faz parte do enredo, mas não estuda...
Os capítulos desordenados de cada manhã.
Eis a noite. És a noite. Reza a noite.

A fé cerra o olhar, mas abre o sorrir.
Ainda tímido, crê no que contempla.
E se não enxerga o quê admirar,
Orgulha-se apenas de teu sorriso.

26 março 2008

Despertador

Deixe que eu te toque sem medo.
Deixe que meus dedos sejam nossa sintonia.
Se disser não, não faça olhando pra mim.
Deixe um recado.Eu entenderei.Sou covarde.

Sou covarde, porque nunca soube
Enfrentar o mundo sem tua presença.
Patético sentimento de quem não vive.
Sobrevive ao amar sem medida.

Mede-se e se mete com a loucura.
Enlouquece e ainda quer mais.
No ápice, não quer voltar à mediocridade.
Esvairá-se na primeira manhã solitária.

No outro lado da cama, a paz;
No centro, a espera por dias melhores;
No lado esquerdo, o coração solitário;
No relógio de cabaceira, é hora de despertar.

O Adorador

Abrigado, Joel não trás consigo mais nenhuma característica de retirante: Hoje tem residência fixa; não busca mais uma estrela que norteie seus passos; e pode, certamente dizer que encontrou seu lugar. Sim, Joel hoje tem um abrigo, não um lar. Um viaduto não pode ser considerado uma moradia. Quando se utiliza a nomenclatura de “residência fixa”, todo e qualquer transtorno de um lugar fedido e úmido é ignorado. Todo o barulho de carros desgovernados e jovens bêbados, que toda noite fazem companhia à insônia de Joel são jogados ao esquecimento. Afinal, não é nenhum sociólogo ou agente do Estado que comprove a salubridade de seu arruinado abrigo. Não têm quadros na parede. (apenas uma rachadura enorme, que parece crescer, cada vez que um caminhão passa em alta velocidade na parte de cima de sua pseudocasa).Joel tem sorte de seu viaduto ficar em frente a um restaurante popular, onde se alimenta com certa qualidade, por apenas um real. Isso pode ser convertido em duas pulseiras que vende com o lucro de cinqüenta por cento. As compra de seu amigo hippie, Raul. Vizinho de desgraça, parceiro empreendedor, sócio e cúmplice de Joel. Mas Joel, o trabalhador, não precisa mais arar terra seca; Joel, não precisa olhar os cactos e expurgar seu sumo até que extraia algum tipo de alimento, que conforme seu estômago por algumas horas, enquanto se apronta pra ir cortar cana, de sol a sol; Não precisa andar léguas em busca de um balde com menos de um litro d’água amarela, rica em doenças e viroses; Joel é um homem da cidade. Um trabalhador. Logo se mudará para um cortiço, oxalá, para um barracão de qualquer favela mais próxima. E, em pouco tempo, quiçá terá a oportunidade de dividir dois cômodos em algum lugar por ali mesmo, região central, onde seu empreendimento medíocre se instaurou. Joel é um homem bem-sucedido. Joel é hoje um Serevino Metropolitano, que se orgulha de ter abandonado suas raízes, sua história, para se aventurar em busca de uma estrela guia, que, de rio em rio, o levou a encontrar nas águas da cidade que caem dos céus, a seca de sentimentos que conforta o seu total desamparo.Mas, segundo sua mãe dizia, Joel significa adorador de Jeová, o seu Deus. Quem sabe, entre uma prece e outra, seu admirável criador lembre-se que aquele papelão nunca poderá ser chamado de cama. Dorme Joel, que amanhã o dia será duro como o de hoje.
O que adorar, então?

18 março 2008

O Invasor de Sonhos

Poderia ser uma noite qualquer.
Poderia ser um sonho comum.
Mas dada pode ser tão simples,
Como o sonho que temos em comum.

Amenizado pela brisa notívaga.
Apaixonado pelo sol da manhã.
Reflexo de uma reflexão breve
Eterna calmaria, soturna e vã.

Os olhos se fecham, abre-se o sorriso.
Os lábios serram-se ao olhar em minha direção.
Eu vejo esse beijo, eu escuto esse beijo.

Voz do desejo mais clichê. Rima óbvia.
Como nossa voz. Como o Invasor de Sonhos.
Como o mesmo sonho de uma noite qualquer.

10 março 2008

Impérios




Herdeiro de um trono anárquico.
Príncipe de um império livre.
Liberto por acreditar nesse reino.
Rei por crer em tal liberdade.

Romântico em sua racionalidade.
Racional em todos os romances.
Apaixona-se sempre com razão.
E tem razão em ser romântico.

Cético, crê em dias melhores.
Em suas crenças, não acredita na dor.
Fiel a esses instintos, apenas crê.
Crê até quando não acredita em si.

Diabólico, já tentou ser anjo.
Angelical, já tentou fazer cara de mau.
Do céu, não têm referências.
Do inferno, não têm lembranças.