22 janeiro 2008

É Terno

Não perde mais seu tempo com ações tolas e desnecessárias, apenas age. As tolices e necessidades nunca foram determinadas por ele.Durante cada breve momento, apenas externalizou com certa aptidão as coisas que fazia. Nunca soube ao certo o que não era para ser feito. As leis, doutrinas, dogmas, não foram feitas para que ele as seguisse e não pensasse nas conseqüências. Ele as seguia até então, por que era um mero alienado, e como tal, não sabia diferenciar a rotina que, sem pudor, confortava a sua retina.
As primeiras imagens que observou foram mais chocantes que a de todos os dias que vivera até aquele momento. Chocantes em sua simplicidade. Simples em sua forma doce de chocar.
Parou, e, pela primeira vez, o tempo simplesmente o acompanhou.
Não era mais o relógio que comandava a situação. Não era ele que corria atrás do tempo.
Pela primeira vez, a linha do tempo e o personagem começam a dialogar, formando uma história mais harmônica.
A princípio, a narrativa teimou em ser confusa e desvirtuou-se para o caminho das intrigas, das ríspidas discussões, das agressões baratas, e pela busca incessante de momentos caóticos e frenéticos.
Mas ele não seguiu esse caminho.
Deu meia volta e desviou.
Seguiu em frente apenas quando se sentiu seguro para pular o mais tenso obstáculo, que por mais de décadas o intimidou, a morte.
Pensou nela como se fosse um caminho natural. Pela primeira vez, entendeu a evolução e não guardou o medo ao lado do caderno de biologia antigo, que anotara suas lembranças longínquas das aulas do colégio.
Desta vez, apenas pensou de frente para trás. Viu o fim como um caminho natural, e foi até o fim da estrada. Se antes se sentia acuado, pensou em chegar até o momento de maior periculosidade, e reviver o trajeto até retornar de onde deveria sair.
E saiu. Sem medo.
Viveu.
Cada estilhaço de tempo que cortou outrora era arma, hoje passou a ser instrumento de fuga. Com aqueles pedaços de vidro, pôde cerrar as cordas que o aprisionavam até então.
Se ontem não respirava, hoje és brisa.
Sem telefone a tocar.
Sem se preocupar com as cobranças empilhadas no tapete de entrada.
Sem nó de gravata a sufocar.
Sem perder um pôr do sol.
Sem deixar de aplaudir a aurora debutante de sua nova vida.
Não tem mais dúvidas de que fez a escolha certa.
Agora, ansiosamente, espera para que a noite acabe, e que enfim, saia desse sonho, e que entre um compromisso e uma obrigação, possa dedicar uns cinco minutos a refletir no sonho que, só por este terno momento, não deseja que acabe jamais.

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