23 maio 2006

Arquivo n° 15 33

Os Bin Laden Paulistanos

Durante dois anos o Governo do Estado de São Paulo, por meio da Secretaria de Segurança Pública, negociou indiretamente com os líderes do PCC(Primeiro Comando da Capital) a chamada sensação de segurança, que pairou sobre as terras paulistas.
Por mais que existissem casos de violência, a situação sempre parecia estar sobre controle, pois as autoridades competentes jamais deixavam transparecer à opinião pública o total desgoverno e submissão ao crime organizado.
Lógico que nenhuma informação dessa é confirmada, mas na atual estrutura do Estado em relação a segurança e políticas públicas, não é difícil de se imaginar tal acordo.
O PCC surgiu em 1993 e no começo era apenas um grupo isolado, que tinha o intuito de organizar os presos e as lideranças dentro dos presídios. O tempo passou, três líderes estiveram no comando da facção(Cesinha, Gelião e Marcola) e a dependência das autoridades só aumentou.
O que era para ser um tranqüilo final de semana de dia das mães, se transformou em um confronto sangrento entre criminosos cada vez mais organizados, e uma polícia cada vez mais desmotivada.
Na quinta-feira com a transferência de 765 presos para o interior, entre eles o líder do PCC Marcola, iniciou-se uma onda de ataques a bases comunitárias da PM, delegacias, bancos, incêndios de carros, de ônibus e assassinatos a policiais, muitos destes à paisana.
A Secretaria de Segurança divulgou na tarde desta segunda-feira seus últimos números*: 180 ataques, 91 bandidos presos, 38 suspeitos mortos e baixa de 49 PMs.
Hoje estava vendo os desabafos dos parentes das vítimas na televisão, e uma das pessoas indagou: “Onde estão os direitos humanos? Cadê aquelas instituições que defendem os direitos humanos para bandidos?”.
Bem, infelizmente eu não sei onde elas estão agora, mas sempre estiveram presentes desde 1992, quando no outubro vermelho, o Carandiru foi o palco do massacre de mais de 100 pessoas. Sim, os famosos bandidos que antes foram caça e que hoje são caçadores.
Não estou aqui para dar uma de jornalista de coluna policial, muito menos para bancar de defensor do crime organizado.

Quero falar apenas do que eu sei.

Sei que minha agência foi metralhada nesta madrugada e meus amigos estão trabalhando quase em estado de pânico.

Sei que as pessoas que estão agindo nesses atentados, os chamados “Bin Laden Paulistanos”, não têm nada a perder, e muitos deles fazem estes ataques para pagar dívidas com seus chefes, sabe-se lá quem são.

Sei que todos falam da questão da segurança, no qual o Estado tem sido extremamente falho, frágil, quase uma piada. Mas por que não falam do Estado falho e frágil na Educação, na Cultura, no Lazer, no Entretenimento?

Sem ações sociais de base, estruturais e concretas, sempre existirão motins e rebeliões contra este Estado desigual. E não adianta dizer que: “é tudo coisa de bandido!”

Quando se tira uma vida, nenhum argumento é tão convincente a ponto de dar razão a quem mata.

Porém, quando um ser humano tem uma vida completamente as margens da felicidade, não tem nada de valioso que justifique sua existência, nenhum conceito de família, de amor, de respeito, é excluído pelo Estado e pela mesma sociedade que agora está em pânico: Qual é o sentido de ser alguém que respeita as leis vigentes?

Será que é justificável viver as margens da lei?

Será que é justificável ser um marginal?

Enquanto os tiros ecoam lá fora e a guerra recomeça, eu me retiro para acompanhar pela televisão a verdadeira batalha da “cobertura” dos fatos que neste momento são notícia no Brasil.

É Parreira, não foi dessa vez que você conseguiu chamar tanta atenção, mas valeu pelo Rogério Ceni ter sido convocado.

Sim, “bola pra frente!”, e um hexa seria uma ótima operação para cicatrizar a memória da nossa sociedade.


* Texto do dia 15/05/2006, com os dados da tarde em que São Paulo ficou sitiada.

Um comentário:

Robson Assis disse...

No dia dos atentados, lembrei de uma conversa que tivemos eu, você e o Doido quando caminhávamos na Rua General Carneiro, subindo em direção ao metrô São Bento, na Festa do PSTU.

Passava uma viatura no final da rua e começamos a falar sobre nossa pseudo-segurança quando vemos um carro da polícia.

Hoje a gente lê no jornal: Dos 109 mortos pela polícia nos dias dos ataques do PCC, apenas 49 tem antecedentes criminais.

Quem é marginal, quem é a lei?

Abraço,
Robas